segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

OS SAPATOS E A ÉTICA

Segundo Mauro Poggia, advogado suíço contratado pela familia de Muntadhar al-Zeidi, o jornalista que jogou sapatos em George W. Bush, seu cliente deverá pedir asilo na Suiça.

O advogado afirma que al-Zeidi corre risco de vida em seu país natal e, assim que for liberado do presídio onde segue detido, irá à embaixada suiça no Iraque e solicitará, oficialmente, pedido de asilo ao país dos Alpes.

Apesar de ter incorrido em crime segundo as leis de seu país (agressão à chefe de Estado de outro país), não é possível afirmar que Al-Zeidi tenha cometido qualquer comportamento imoral ou antiético.

Percorrendo qualquer código moral de qualquer cultura ao redor do mundo, encontramos "regramentos" de não-agressão. Entretanto, o comportamento do jornalista não foi de agressão, e sim, de desesperado protesto. Protesto contra a política colonialista dos Estados Unidos no mundo. Protesto contra as crescentes ocupações, por tropas estadunidenses, de países cuja política desagrada aos Estados Unidos (ou que possuem reservas naturais que interessam aos interesses estadunidenses). Protesto contra a invasão e ocupação de seu próprio país, hoje desprovido de qualquer autonomia com relação à seu próprio destino.

A manifestação contrária (protesto) é um direito que, apesar de estar alijado de muitas morais e legislações ao redor do mundo, deve estar amplamente garantido pelos princípios Éticos do nosso planeta.

A manifestação contrária, a antítese, o protesto, está presente no ser humano. É parte da nossa natureza, é parte da formação e organização da nossa ética. Na realidade, é parte compulsoriamente manifestada, pois o princípio de que a natureza possui leis perfeitas cabe também às relações humanas, afinal, a humanidade é parte desse todo perfeito que é o organismo-Terra.

A democracia, perdeu muito de sua essência quando virou um "sistema de governo", simplesmente. A democracia é, também, sistema de governo, mas é mais que isso. A democracia é a prática do holismo nas relações humanas. A democracia, posta nesse contrato social, nessa sociedade, nada mais é do que a premissa de que admitimos que nenhum de nós possui a "verdade", pois a "verdade" não existe a partir de um ponto. Jamais conhece-se a "verdade" de um vaso de porcelana, por exemplo, se o compreendemos apenas pelo que nossa limitada visão nos oferece.

Tampouco, a democracia é a "soma" justaposta de todos os pontos-de-vista. Ela é, sim a interposição, a interligação, a transversalização desses pontos, vistos como algo único.

Isso faz com que não haja lei humana capaz de suprimir algo que é natural ao ser humano, ou seja, seu ponto-de-vista, sua idéia, que poderá ser divergente ou convergente, mas que será sempre uma idéia diferente.

Entretanto, convergente ou divergente, tolher essa condição natural do ser humano é como uma panela de pressão... Coloca-se no fogo e espera-se... Em algum momento, vai estourar.

No caso de Muntadhar al-Zeidi, foram apenas sapatos arremessados, como quem diz "Ei, vocês! Esse país é nosso também! Eu e muita gente pensamos diferente daquilo que vocês estão fazendo aqui!" Podemos barrar algumas manifestações, é verdade, mas a natureza sempre encontra uma maneira de reequilibrar-se, de voltar a executar as suas próprias leis, sua própria ética.

Nesse caso, foi através de um sapato.

Asilo à Muntadhar al-Zeidi. Estamos torcendo.

0 comentários:

Postar um comentário