segunda-feira, 24 de junho de 2013

Outra geração, outra estética

O Partido dos Trabalhadores constituiu-se, sem dúvida, na maior experiência organizativa da esquerda mundial dentro de um contexto democrático. Da mesma forma – e por isso mesmo – o PT constituiu-se na maior ferramenta de luta disponível nas mãos da classe trabalhadora e dos movimentos sociais.

Por outro lado, temos visto nos últimos anos o avançar de outras formas de participação da população, ancoradas em novas plataformas de comunicação. Essas novas plataformas alteram significativamente o papel de instituições cujos objetivos estejam no contexto da organização social.

Em outros momentos da história, os sindicatos, associações comunitárias, juvenis, estudantis, de classe, movimentos sociais e partidos políticos constituíam-se nas únicas estruturas disponíveis para que alguém pudesse incidir na política local e auxiliar na construção de novos processos e novas realidades. É dentro desse contexto que o PT constitui-se como a grande alternativa de organização da classe trabalhadora e grande aliado dos movimentos sociais. Era a era da rede social "física".

As contradições advindas da chegada do PT ao poder, primeiro em âmbitos municipais, culminando ao final na chegada do partido com Lula à presidência da república, institucionalizaram excessivamente o partido, burocratizaram e esvaziaram a maior parte das instâncias partidárias – sem contar aquelas que simplesmente morreram desoxigenadas, como é o caso das zonais e a grande maioria dos núcleos. Com o surgimento da internet – principalmente com a chegada da internet 2.0, a “internet social” – essa realidade foi substancialmente aprofundada.

Muitos militantes encontraram na internet uma nova forma de se manifestar, aparentemente ainda mais robusta e abrangente do que as que se perdera dentro do PT. O problema dessa forma de organização é que ela fez com que essa massa crítica simplesmente deixasse de gastar energia tentando revitalizar instâncias moribundas dentro do partido – o que só sedimentou o afastamento entre base social e estrutura partidária.

Esse cenário do qual não trata-se apenas da militância do PT, mas da população de modo geral que encontrou na internet um campo aberto para a participação, o debate, a capilarização de suas ideias, não parece ter sido compreendido pelo partido - repito - burocratizado e esvaziado sob o ponto de vista de suas instâncias de participação (mas não esvaziado de militância!).

O fato é que as novas tecnologias de comunicação potencializam muito as individualidades, uma vez que eu não é mais preciso estar subordinado a um partido para conseguir espaço e ser efetivamente ouvido e incidir – ao menos no campo das ideias – na sociedade em que se vive. Por outro lado, também potencializa muito a associação entre as pessoas e a construção coletiva de concepções, projetos e programas comuns. É uma moeda com duas faces que precisam ser compreendidas, principalmente no mecanismo de relação entre uma e outra.

Dito de outra maneira, uma agremiação de qualquer tipo, seja uma associação, um veículo de comunicação ou um partido político, somente será considerado uma referência de conteúdo se ele próprio comportar-se como parte de um processo que não controla, e não como a direção que estabelece os parâmetros regentes da construção.

O problema é que o pensador tradicional vai dizer “isso não é possível, o partido deve organizar a sociedade e virá conosco quem estiver alinhado conosco”. Esse pensamento é exatamente o que está nos distanciando cada vez mais da massa crítica do nosso país. Se o partido quiser organizar as forças progressistas do país, o partido também deve estar aberto a ser organizado pela classe trabalhadora e pelos movimentos sociais nos termos destes. Mas não é exatamente isso que fazemos? Mais ou menos... O fato é que nos organizamos segundo o que pensamos que a classe trabalhadora e os movimentos desejam. Nos organizamos esquecendo dos novos atores, essa grande massa que está construindo opiniões e incidindo na formação da opinião de outras pessoas através da internet, pessoas que tem muito a dizer e contribuir – mas que não estão, não podem ou não querem fazer parte das instâncias tradicionais do partido.

Essas pessoas vão opinar e vão construir alguma coisa – e cabe ao partido ter a responsabilidade de contribuir para que isso seja feito de forma politizada e que sirva para o alinhamento constante entre o nosso programa e os anseios da classe trabalhadora e dos movimentos sociais desse país – entenda-se movimento social como os nossos aliados tradicionais, mas também esses novos movimentos que não compreendemos ainda muito bem, mas que devemos criar as condições necessárias para o diálogo e a nossa adaptação à estética do processo, não o contrário.

De certa forma, partidariamente nos descolamos até mesmo do que experimentamos de positivo em nossos próprios governos. O Gabinete Digital do governo Tarso Genro no RS é um excelente exemplo sobre como proporcionar formas de participação fora do escopo tradicional, um excelente exemplo sobre como adaptar-se aos meios em que as pessoas decidem que irão atuar politicamente, e canalizando essas contribuições, ao invés de gastar energia tentando convencer as pessoas à moldar-se aos meios que consideramos adequados.

Em grande medida, as forma como essas manifestações estão ocorrendo – cuja mobilização contou largamente com as redes sociais – tem muito de culpa do próprio PT em não oferecer à essa massa alternativas de contribuição esteticamente adequadas e canalizadoras dessa energia transformadora e plasmadora de uma nova sociedade, de um outro mundo que segue sendo possível. Apesar da presença de movimentos de direita que tentam apropriar-se do processo, muitas das nossas bandeiras de luta estão lá, caminhando de forma autônoma e gritando que não os representamos...

O que precisamos ter em mente é que não dialogaremos mais com a nova massa crítica e pensante do nosso país com os mecanismos e ferramentas que deram certo nas décadas de 80 e 90. O que nos falta é a percepção de que um partido é uma grande rede social tradicional e, nosso desafio é oferecer aos que querem contribuir com uma outra sociedade, soluções de participação e engajamento baseadas nos novos mecanismos.

Então a questão é muito mais estética do que programática? Sim, é exatamente isso. O programa do partido está adequado a realidade, bem como a política de nossos governos. Obviamente, sempre pode melhorar, sempre precisará ser revisto, revisado - eventualmente desfeito e reconstruído, mas em linhas gerais é o programa certo, só que em outro tempo, outra geração, outra comunicação, outra participação, outra estética.

1 comentários:

Milton Cruz disse...

A trajetória do PT, como a de outros partidos como o PMDB, PDT e PTB, indica que a questão central é a da ética (e não da estética) que pode mudar a prática das instituições em favor da implementação de um programa de desenvolvimento sustentável e inclusivo.
Milton

25 de junho de 2013 às 10:06

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